Algo que aceita as perguntas "o que?" e "como?" mas resiste enfaticamente a responder "por que?".
Fetiche não tem explicação.
Perguntar o por que de um fetiche, o motivo da atração/fascínio/tesão que uma determinada coisa exerce sobre uma pessoa em particular, sem afetar (ou, até mesmo, repelir) milhares de outras, é como perguntar a um alpinista por que ele precisa escalar uma montanha: "Porque ela está lá".
(uma resposta, vale dizer, incompreensível para qualquer um que esteja plenamente satisfeito com passeios tranquilos em ladeiras amenas)
Também é praticamente impossível datar a origem de um fetiche na vida de uma pessoa. Quase sempre confunde-se com as lembranças mais remotas, aos primórdios da formação da identidade. Como datar algo que já faz parte de você desde que "você se conhece por gente"?
Eu tenho dois grandes fetiches. Até onde posso dizer, sempre os tive. Curiosamente, o mais simples contradiz um tanto o que acabei de escrever, pois eu me lembro com clareza de quando começou. Uma das minhas lembranças mais antigas (eu devia ter 3 anos, talvez 4): um comercial de TV mostrava um casal sentado a mesa, mãos dadas, olhar apaixonado... a câmera descia até revelar que, sob a mesa, os pés do casal se tocavam e roçavam, ternamente, acariciando-se.
Embora todo o contexto tenha se perdido, a impressão que esse detalhe provocou em mim ainda é nítida, marcante. De algum modo, a criança que nada sabia (conscientemente) de sexualidade, associou permanentemente o toque de pé com pé com prazer, ternura, atração, tesão. Daquele momento em diante, sua atenção aos detalhes sempre se voltou para os pés, sempre buscou (re)encontrar a visão desses momentos fugazes de toque (na vida, nas fotos, nos filmes), sempre se excitou ao sentir esses toques nos seus próprios pés.
Mas esse é um fetiche muito simples. Quase uma nota de rodapé da podolatria em geral. A qual, devo dizer, nem me atrai tanto assim, uma vez que não é meu barato ter pés esfregados no rosto, supercloses em dedões e calcanhares ou o ato de lamber solas (as fantasias mais comuns em sites dedicados ao tema). Tudo o que me importa é o contato de pé com pé, só isso. Um elemento erótico que se coaduna sem grandes problemas com qualquer relação sexual convencional ou mesmo com trocas de carícias mais calientes entre "ficantes", excluindo apenas quem encara os pés como fonte de nojo, claro. Em inglês há até uma tag específica para utilizar em sites de busca: footsie.
Já para o fetiche que é o tema central desse blog, infelizmente não há nenhuma tag específica. Togetherness é um termo impreciso, em grande parte inadequado, mas ainda assim é a referência mais razoável, por isso optei por adota-lo aqui, ao menos até que algo melhor apareça. No universo da oferta de fetiches online quase todos os subtemas são associados a uma palavra, uma tag, mas no caso desse meu "fetiche por pessoas presas uma a outra" as buscas acabam tendo que ser feitas com termos compostos, frases, sentenças que se tornam confusas em sua necessidade de explicar em demasia, o que torna as buscas difíceis e frustrantes.
Ao contrário do meu apego pelo footsie, não tenho a menor ideia da origem desse meu fascínio e nunca conheci pessoalmente ninguém que o compartilhasse. Faz parte de mim, como uma fantasia insistente, uma marca. Já presente até nas lembranças mais remotas de fantasias infanto/juvenis, nos troca-trocas com as primas da mesma idade que sequer imaginavam que a brincadeira "inocente" de amarra-las uma a outra ou a mim era mais do que um mero jogo de polícia e bandido (ou talvez elas sacassem muito bem e a ingenuidade fosse minha... mistérios da infância).
Desde o primeiro momento de internet em casa, animei-me com a possibilidade de não apenas encontrar abundante material foto/videográfico como também os canais adequados para criar relações com quem compatilhasse dessas mesmas fantasias. Foi frustrante descobrir que as coisas não seriam tão fáceis assim. Constatar a, já citada, dificuldade com tags e buscas deixou evidente que o interesse por esse fetiche é um tanto minoritário, o bastante para não inspirar a criação de seções específicas em praticamente nenhum site ou portal sobre fetichismo. Descobri que se meu interesse fosse simplesmente pessoas amarradas/acorrentadas (bondage), ou palmadas (spanking), ou cócegas (tickling), etc. eu teria material suficiente para enjoar do assunto (até mesmo coprofagia e smashing tem trocentos sites específicos e tags bem definidas e reconhecidas).
Mas nenhum fetichista desiste fácil. Com (muita) paciência consegui juntar uma coleção bastante respeitável. E, no processo, involuntariamente me tornei um razoável conhecedor do universo do fetichismo em geral. Afinal, garimpei muito em sites e portais dos mais variados tipos de fetiche (incluindo aqueles que não me despertavam nenhum interesse) na esperança de flaglar até os mais fugazes vislumbres do meu objeto de desejo. Evidentemente, no meio de milhares de fotos bondagistas e sadomasoquistas há sempre uma porcentagem de imagens de pessoas amarradas ou acorrentadas juntas, embora não tanto como se poderia supor.
Mas está longe de ser o suficiente. Por dois motivos:
1) O foco dessas imagens, claro, é o ato de amarrar, imobilizar e/ou torturar, sendo que a presença de duas pessoas ao invés de uma representa no máximo um bónus no cenário. Para mim não é interessante a imobilização e muito menos a tortura, a não ser como algo meramente incidental. O que interessa é o fato de que aquelas pessoas não tenham como se separar, seja de forma forçada ou por livre e expontânea vontade. De fato, acho muito mais interessante que as personagens dessas imagens/vídeos tenham a mais total liberdade de movimento, sendo a única restrição o fato de terem que ir ou vir sempre juntas. Material que atenda essas espectativas é bem mais raro.
2) De modo geral a pornografia disponível na rede é repetitiva, feia, sem imaginação, estetica e artisticamente pobre... no limite: brochante. O material é tão orientado ao consumo e acúmulo puro e simples que nada mais faz do que reproduzir ad nauseum os mesmo cenários, situações e estéticas. Não surpreende, não excita, não tem beleza. Ao invés de me estender sobre esse ponto, farei minhas as palavras do escritor Alan Moore, que explicam isso com muito mais clareza do que eu conseguiria:
Nós temos pornografia em todo lugar. O problema é que a qualidade dessa pornografia está bem distante do padrão estético daquela época que representamos no “White book”. A pornografia que temos hoje parece não ter nenhum valor artístico, parece criada para estimular as pessoas a qualquer outra coisa que não sexo. Uma das melhores coisas da arte, da arte genuína, é que quando vemos uma imagem ou descrição de algo que se relacione com um sentimento que temos e não conseguimos expressar, ela nos faz sentir menos sozinhos. E o que a pornografia de hoje faz é o exato oposto. Faz com que você se sinta envergonhado, mais sozinho do que nunca. Vemos ou lemos pornografia sozinhos, como se o nosso prazer fosse algo para se envergonhar, algo deplorável. E isso é uma tremenda pena se pensarmos que se trata de uma atividade humana tão prazerosa. Praticamente todos os diferentes gêneros de ficção que temos hoje são baseados nessas áreas improváveis da atividade humana, como caubóis, detetives e monstros. Enquanto aquilo que mais temos em comum, que é algum tipo de prazer sexual, só pode ser abordado nesse gênero grosseiro, tolo e por baixo do pano pelo qual todos se sentem culpados e envergonhados. O que pretendíamos com “Lost girls” era eliminar essa relação imediata entre pornografia e vergonha. Pensamos que se pudéssemos produzir uma pornografia que fosse bela o suficiente e inteligente o suficiente e séria em sua aplicação então talvez fosse possível que pessoas civilizadas e dignas não se sentissem envergonhadas de ter uma obra pornográfica em suas casas. (Alan Moore: Entrevista completa para o G1)A idéia de montar esse blog tem amadurecido a muito tempo. Desde que a idade e o tempo transformaram minha forma de lidar com meus fetiches, sobrepujando meu receio de que pudessem ser usados contra mim de alguma forma. A necessidade de buscar pelo fetiche perdeu espaço para a necessidade de compartilha-lo. Uma coleção acaba tendo pouco valor quando ninguém sabe que existe. Mas não queria criar mais um espaço para pornografia pobre (até porque taí uma coisa que não falta na rede). Meu raciocínio era simples: se eu ia criar um blog temático para reunir e expor todo o meu material sobre "togetherness fetish", por que eu não poderia fazê-lo segundo a minha própria lógica e valores estéticos e artísticos? Afinal, esse é meu espaço, meus fetiches, meus gostos. O espaço que sempre quis encontrar na internet e nunca consegui. Que os visitantes se adaptem a ele ou o abandonem. Simples assim. Mas queria que as opções ficassem bem claras para qualquer visitante. Assim, seguem-se abaixo as características principais sobre o blog:
1) O blog é temático, reunindo fotos, vídeos, ilustrações e textos relativos ao fetiche por pessoas unidas/presas uma a outra de alguma forma, permanentemente ou não. Esse material abarca vários subtemas que vão desde pessoas algemadas uma a outra até siamesas (ver a página de tags para mais detalhes)
2) O blog, portanto, abarca pornografia e erotismo, mas um dos seus objetivos é tratar a pornografia como gênero artístico, seguindo padrões estéticos que ME agradam. Então não espere encontrar material tosco ou chulo por aqui (embora, claro, tudo o que se refere a sexo seja tosco ou chulo para alguém... mas isso constataremos post a post).
3) Não se trata de um blog sobre bondage e sadomasoquismo. Embora haja material aqui desse gênero, o foco e os critérios para organização desse material são diferentes dos de um site sobre bondage. Melhor deixar isso claro para não frustrar espectativas.
4) Como a orientação sexual se sobrepõe ao fetiche, a esmagadora maioria dos posts mostrará mulheres presas uma a outra, mas não há uma intenção de que isso seja exclusivo. Ocasionalmente haverá imagens de mulheres unidas a homens e, se houver pedidos e interesse, poderá também haver homens unidos a homens.
5) Evidentemente, o blog versa antes de tudo sobre fantasias. É claro que o fetiche por togetherness só pode se manifestar no "mundo real" na forma de jogos e fabulações. A realidade concreta de duas pessoas presas uma a outra permanentemente é, sem dúvida, atroz e nem mesmo eu desejaria permanecer nessas condições além do que fosse prazeiroso como fantasia. Ou seja, quando algo como gêmeas siamesas aparecer nesse blog será na forma de (re)criações artísticas, fabulações, não na sua realidade médica concreta. Recorrendo a Alan Moore, num trecho de sua grandiosa obra pornográfica, Lost Girls: "(...) se isso tudo fosse real, seria horrível (...) mas elas são ficções, tão antigas quanto as páginas onde aparecem, nem mais nem menos. Elas não são contaminadas pelo efeito e consequência. Ora, elas são quase inocentes."
Tudo isso dito, aconcheguem-se, fiquem a vontade, tirem os sapatos e divirtam-se. E, para entrar no espírito, lembrem-se de manterem-se bem unidas... ;)
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